O impacto das perdas e ganhos dos grupos políticos e ideológicos de um lado ou de outro, pesa muito mais no enfraquecimento do sistema cognitivo dos indivíduos.
Isso acontece porque o discurso de um lado é tão contraditório quanto o do outro, e nós, enquanto espectadores desse embate entre duas linhas ideológicas antagônicas, estamos mais preocupados em fortalecer nossas certezas pessoais, aquilo que converge para nossas verdades individuais, do que em enxergar a totalidade do discurso.
Ou seja, ignoramos as contradições no discurso do candidato X ou do candidato Y e tratamos apenas fragmentos desse discurso como Verdade Absoluta.
A verdade, por sua vez, é completa; não é fragmentada como estamos construindo em nosso esquema mental.
A verdade só pode ser vivenciada a partir daquilo que está perto de nós, naquilo que podemos experimentar, tocar e sentir de maneira superficial, ou seja, pelos sentidos primários, e consequentemente de maneira mais profunda e subjetiva.
Somente essa conexão entre o contato externo e uma resposta interna pode, de fato, nos revelar uma verdade.
Quando a verdade que internalizamos é alheia e distante, o que estamos fazendo nada mais é do que criando um sistema de certezas frágeis e corrompíveis.
E a construção desse esquema mental fragmentado, a nível individual, tem como consequência o enfraquecimento da capacidade cognitiva do ser humano.
O enfraquecimento da cognição humana
Quando o ser humano não consegue utilizar sua cognição de maneira efetiva, a realidade passa a ser problemática.
Em outras palavras, a incapacidade cognitiva do indivíduo comum cria o conjunto de problemas que alimentam as instituições, sejam elas políticas ou industriais.
Assim, nossa incapacidade cognitiva é o que está depreciando nossa condição, tornando-nos indivíduos problemáticos e incapazes de lidar com o mundo e com os desafios de maneira autônoma.
Essa incapacidade cessa nosso poder de realização, de tornar real aquelas vontades que se manifestam de maneira particular. Isso nos sucumbe à vontade coletiva, colocando tudo e todos à frente de nós mesmos.
Não só isso: essa condição estimula nossa falta de responsabilidade, nossa incapacidade de respeitar e integrar as múltiplas facetas de uma única afirmação.
Isso nos coloca em uma forma de lidar com a realidade de maneira reativa, por impulso inconsciente — não provindo por uma força intuitiva, mas sim por um mecanismo instinivo, um estado e guerra puramente emocional, falho e fraco.
Ignorar as contradições das narrativas nos torna mais fracos
Um exemplo disso pode ser visto em uma das pautas do presidente eleito nos Estados Unidos, que é combater o globalismo, enquanto o outro lado é visto como um defensor do globalismo.
Uma das pautas do globalismo é o transumanismo, que é um movimento abrangente em várias áreas do conhecimento humano, com o objetivo de “melhorar” a condição humana por meio de tecnologias.
Porém, observe que o presidente que representa o conservadorismo, e que vai contra essa ideia de globalista, tem como principal expoente ou influenciador da sua campanha uma figura que encabeça o transumanismo mundial e que, ao mesmo tempo, condena o próprio globalismo, sendo admirado e apoiado por teóricos da conspiração de todo o mundo.
Perceba como essa contradição não é apenas sobre dividir para conquistar.
Isso tem implicações muito mais sutis sobre o ser humano, que, ao se prender emocionalmente a uma interpretação de realidade puramente voltada para um sistema de crenças induzidas e presas em discursos padronizados, numa gradiente que varia de uma direita conservadora a uma esquerda progressista, adota esses discursos contraditórios como verdades absolutas e, assim, enfraquece sua capacidade cognitiva.
O indivíduo comum não quer o melhor para o mundo. Ele quer apenas mostrar que está certo e viver o sentimento de sair vitorioso, mesmo que isso represente a sua própria destruição.
Para que você entenda, a cognição é o conjunto de habilidades mentais que permitem a obtenção de conhecimento e compreensão.
Ela envolve percepção, organização e compreensão de informações para serem utilizadas no raciocínio e aprendizado e é responsável pela memorização, pensamento, expressão de sentimentos, foco em atividades, percepção das coisas por meio dos sentidos e o aprendizado de novas habilidades.
A capacidade cognitiva é a aptidão de cada pessoa para interpretar os estímulos do ambiente e de si mesma, tomando decisões sobre o próprio comportamento.
Quando verdades são construídas a partir de um sistema contraditório de meias-verdades — ou seja, quando ignoramos as contradições e jogamos para o inconsciente tudo o que não fortalece nossas certezas —, nossa cognição se torna seletiva e, portanto, limitada.
Isso gera uma configuração mental fragmentada que, tanto a nível inconsciente quanto consciente, desdobra-se numa incapacidade de exercer com efetividade e máximo potencial a própria condição cognitiva.
Lembra do transumanismo?
Com seres humanos cada vez mais incapacitados, mais fracos em autonomia, capacidade de tomar decisões e interpretar a realidade por meio de uma experimentação verdadeira, teremos instituições cada vez mais fortalecidas e prontas para assumir essa responsabilidade por nós, já que a deficiência cognitiva será um problema a ser resolvido pela indústria, pela política e pelas instituições dominantes.
No fim, todos nós perdemos
O ganho de um lado, leva à perda do outro, que buscará se fortalecer no próximo ciclo. Essas forças se compensam, e isso vai muito além da rivalidade ideológica.
Um sistema compensatório não só intensifica o conflito, mas também sintetiza uma realidade que não desejamos para nós.
O simples fato de aceitarmos verdades contraditórias como absolutas já nos transforma em verdadeiras máquinas construtoras de uma realidade oposta às nossas vontades — ou seja, uma realidade que não queremos.
Isso leva os indivíduos a se comportarem inconscientemente, aceitando a implantação de uma agenda da qual, mesmo sendo contrários, tornam-se incapazes de influenciar nas decisões que moldam o mundo e o caminho que estamos seguindo, ou melhor, a realidade que já vivemos.
Essa realidade vai muito além de uma dimensão coletiva; trata-se de uma realidade individual, de pessoas cada vez mais escravizadas por seu sistema de crenças, submetidas ao descontrole emocional e incapazes de serem livres, transformando a liberdade numa utopia em vez de uma realidade.
Reflita sobre isso e busque, antes de tudo, a autovalorização e a sua própria expansão, não a expansão daquilo que convém a forças externas e alheias a você.
Espero que essas informações tenham sido úteis.
Um forte abraço e até a próxima.